Por Elioenai Paes, publicado originalmente no saude.ig.com.br
O Ministério da Saúde lançou novamente campanha de vacinação contra o vírus do HPV, causador do câncer de colo de útero, terceiro câncer que mais mata mulheres no Brasil.
A vacina é oferecida gratuitamente a meninas de 9 a 11 anos e protege contra os tipos mais letais do vírus. A imunização poderia evitar as cinco mil mortes anuais que acontecem por causa do desenvolvimento desse câncer facilmente prevenido.
A Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) recentemente aprovou a vacina para mulheres até 45 anos. Mas, para essa faixa etária, a imunização não é oferecida gratuitamente.
Muitas pessoas, no entanto, ficam receosas quando o assunto é vacinação contra o HPV, por causa de informações sobre o tema disseminadas principalmente na internet. A vacina pode causar paralisia de membros? Posso contrair o vírus por meio da vacina se minha imunidade estiver baixa? Veja essas e outras perguntas respondidas por especialistas na área:
1 – A vacina contra o HPV pode causar paralisia?
Logo no início da aplicação da vacina contra o vírus, notícias apontavam que algumas garotas ficaram paralisadas. No entanto, Isabela Ballalai, presidente da Sociedade Brasileira de Imunizações (SBIm), explica que foi provado se tratar de um caso de histeria coletiva.
“A vacina não causa paralisia. Milhões de doses já foram aplicadas no mundo todo há mais de 10 anos e não tem havido nenhum caso de evento adverso grave”, tranquiliza a médica.
“O que aconteceu em São Paulo foi uma situação de histeria e medo. Tudo foi investigado e a situação que aconteceu foi mesmo de estresse. Já vi uma menina desmaiar com a vacina de hepatite B. Não era por causa da vacina, e sim do estresse”, comenta a médica.
A especialista em cânceres ginecológicos e presidente do Grupo Brasileiro de Tumores Ginecológicos, Angélica Nogueira, confirma a informação.
“Os casos que aconteceram no Brasil não tinham relação com a vacina. A imunização é segura e evita uma doença muito relevante. Esse mito tende a derrubar um benefício importante. Recomendo intensamente a vacina”, alerta a médica.
2 – A vacina pode causar efeitos colaterais? Quais?
Isabela explica que toda vacina pode causar efeitos adversos. “São bem raros, mas acontecem”, diz ela.
“A vacina contra HPV pode causar dor no braço e o local da aplicação pode ficar vermelho, inchado e um pouco quente. São eventos adversos esperados e comuns”, diz ela.
Segundo a médica, os efeitos colaterais dessa vacina são bem mais fracos do que as de outras imunizações conhecidas e amplamente aceitas pela população, como a vacina contra difteria, coqueluche e tétano, que costuma causar febre.
3 – Os riscos dos efeitos colaterais compensam os benefícios que a vacina traz?
As especialistas são unânimes: sim, compensam. “Sem dúvida nenhuma, o risco tende a zero, é mínimo. São eventos adversos leves e o que se quer prevenir são cinco mil mortes por ano e mais 15 mil novos casos de câncer de útero no Brasil, o que mais mata a mulher brasileira”, diz a presidente da Sociedade Brasileira de Imunizações.
“Outras vacinas bem mais complicadas são aplicadas na infância e os eventos adversos são tolerados. A vacina do HPV é muito segura e causa pouca reação nas meninas”, diz Isabela.
Angélica complementa que, se o câncer de colo de útero não for prevenido, a doença também pode causar infertilidade, alterações no útero, intestino e urina e levar à morte. “No País é comum ser diagnosticada já em estágio avançado”, alerta a ginecologista.
4 – Basta uma dose da vacina para estar imunizado?
“Não é isso o que os estudos mostram. Uma dose não é suficiente”, alerta Angélica. “A maioria dos estudos diz que o ideal é tomar três doses”.
O Ministério da Saúde oferece a segunda dose após seis meses da primeira e a terceira dose cinco anos depois da segunda aplicação, como forma de reforço.
“Tem de tomar no mínimo duas doses”, diz Isabela. “Há dois esquemas de vacinação: para menores de 15 anos, são três doses no intervalo de cinco anos”. Ela explica que o sistema imunológico de garotas abaixo de 15 anos responde melhor do que as mais velhas, fazendo com que o intervalo de cinco anos seja seguro.
“Na rede privada, no entanto, preferem oferecer tudo em seis meses, por receio de cinco anos depois a garota não voltar tomar a vacina. Também está correto”, diz ela.
O outro esquema de vacinação é destinado às portadoras de vírus HIV, de nove a 26 anos. Pelo fato de o vírus prejudicar a resposta à vacina, a médica explica que não pode esperar cinco anos para aplicar a outra dose, sendo mais seguro aplicar as três dentro de seis meses.
5 – A vacina protege contra qualquer tipo de HPV?
“Há dezenas de tipos de vírus HPV, mas essa vacina cobre os quatro principais tipos, os que mais causam câncer de colo de útero”, explica Angélica. “A vacina protege contra os tipos 16 e 18, responsáveis por 70% dos casos de câncer de colo de útero e os tipos 6 e 11, responsáveis por 90% das verrugas genitais”, conta a presidente da Sociedade Brasileira de Imunizações.
“É importante lembrar, no entanto, que a mulher deve fazer os exames preventivos, como o Papanicolaou, da mesma forma”, alerta Angélica.
6 – Tomando a vacina ainda é necessário usar preservativo?
Sim, é necessário. “O preservativo está indicado para prevenir várias doenças sexualmente transmissíveis (DST), como o HIV. A camisinha, no entanto, não protege 100% contra o HPV, já que não é necessário penetração para contrair o vírus”, explica Isabela.
7 – A vacina é feita com vírus vivos? Se a imunidade estiver baixa, é possível pegar HPV ao se vacinar?
As especialistas explicam que não, a vacina não é feita com vírus vivos nem atenuados, como o caso das vacinas de catapora ou sarampo.
“Não se pega HPV tomando a vacina do HPV. Ela é feita com uma cápsula do vírus, mas sem o vírus dentro”, explica Isabela.
“A pessoa vacinada fica com um vírus idêntico ao selvagem, mas sem conteúdo, sem DNA e sem aquilo que causa a doença. É apenas a cápsula”, explica a médica. O organismo, com essa cápsula, entende que é o vírus e fabrica anticorpos contra ele. A vacina protege mais pelo nível maior de anticorpos.
8 – O que acontece com quem opta por não se vacinar?
“Não vacinar é colocar a vida em risco. É uma doença com 50% de letalidade, uma doença grave”, alerta Isabella. “Não faz sentido não se vacinar quando se tem uma imunização segura, gratuita e disponível para todas as meninas em todos os postos de saúde”, diz ela.
Ela detalha que 80% da população sexualmente ativa, ao longo da vida, se infecta com o HPV.
“Não é raro, não é um vírus do grupo de risco, não é um vírus que acontece com sexo inseguro. O HPV está no meio de todos nós”, diz ela.
Isabela complementa: “A nossa realidade é de mulheres não vacinadas. Hoje, há muitas verrugas genitais, alta incidência de câncer de colo de útero, câncer da vagina e da vulva, além do homem, no canal anal e orofaringe. Se a mulher não puder se vacinar, ela precisa fazer uma adesão ao Papanicolaou, para identificar lesões precocemente e tratar. A vacina reduz o risco”, diz a presidente do Grupo Brasileiro de Tumores Ginecológicos.
9 – A proteção da vacina contra o HPV dura a vida inteira?
“Espera-se que não a vida toda, mas por muito tempo. De 10 a 15 anos é o que essa vacina já demonstra, mas toda vez que temos uma vacina com menos de 20 anos, não podemos falar que ela durará mais do que isso”, diz Isabella. “É importante a vigilância, que existe no mundo todo, para identificar se precisa de reforços”.
Isabella diz que as primeiras meninas que foram vacinadas no primeiro estudo científico estão sendo acompanhadas para verificar a duração da imunização.
10 – Por que a vacina não está disponível para meninos no Brasil?
Os meninos podem se beneficiar com a vacinação do HPV, explica Isabela, mas no Brasil a prioridade são as meninas. “O HPV é causa de câncer de pênis, mas esse câncer representa 2% dos casos em homens. Individualmente, é importante que o menino se vacine, mas levando em consideração questões de saúde pública, a prioridade são as mulheres, que estão morrendo a cada ano”, explica a presidente da SBIm.
“A Anvisa, no entanto, também aprovou que a vacina seja usada em meninos, mas não é gratuita pelo Ministério da Saúde”, diz Isabella.